BA093785-CD61-452D-9D7D-A5428B1D8992Confira o artigo “A Questão Indígena na agenda social” da jornalista, socialista e militante indigenista, Claudia Correia.  ​​​​

A violência contra os povos indígenas no Brasil remonta a colonização portuguesa e se estende, em todos os contextos históricos, até a atualidade, com requinte de crueldade, se caracterizando como crime contra a humanidade. Invasão de territórios, escravidão, estupro de mulheres, guerra “biológica” através da disseminação deliberada de vírus, torturas e assassinatos, ausência de políticaspúblicas e uma opressiva dominação cultural através da imposição da língua, costumes e religião marcaram a presença do Estado na vida desses povos. Tudo fartamente estudado e registrado por historiadores, jornalistas, antropólogos e indigenistas, mas, no mais das vezes, silenciado em livros didáticos e museus oficiais ou oficiosos.

Em 2014, o Relatório final da Comissão da Verdade, que investigou os crimes cometidos durante a ditadura militar fez recomendações ao Estado Brasileiro devido “ao esbulho das terras indígenas e pelas demais graves violações de direitos humanos ocorridas sob sua responsabilidade direta ou indireta no período investigado, visando a instauração de um marco inicial de um processo reparatório amplo e de caráter coletivo a esses povos”.

Em séculos de genocídio, os povos indígenas lutam pelo direito à vida. Desde a criação do Serviço de Proteção ao Índio-SPI em 1910, que operou em diversos formatos até 1967, quando foi substituído pela Fundação Nacional do Índio- FUNAI, temos recorrentes fases do que podemos chamar de uma “anti-política” indigenista, ora equivocada, ora corrupta, retrógrada e criminosa.

Hoje vivemos um dramático cerco contra os povos indígenas. A FUNAI de Bolsonaro e demais órgãos federais com responsabilidade legal para atenção com os povos indígenas descumprem seus deveres constitucionais, perseguem e criminalizam lideranças indígenas que lutam por direitos e se omitem diante das frequentes demandas de saúde (em pleno contexto pandêmico), educação, segurança e defesa dos territórios. Os processos de demarcação se arrastam, aliás, mesmo em governos populares como os de Lula e Dilma a burocracia e os interesses econômicos e políticos travaram dezenas de ações até a homologação final para o reconhecimento do direito constitucional de muitos territórios indígenas.

É flagrantemente dramática a situação de fragilização da proteção a povos indígenas isolados e de contato recente, que são os grupos mais vulneráveis e sob ameaça iminente de etnocício. Mais recentemente, com o lobby do agronegócio e da bancada da bala e do boi no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 490 e a tese do “marco temporal” expuseram de vez a face genocida do governo Bolsonaro e das elites brasileiras. A exploração ilegal de madeira e minérios esgotam áreas de preservação e de presença indígena secular, gerando assassinatos e devastação ambiental.

Em resposta, o Movimento Indígena se fortalece e segue dando sua usual demonstração de resistência. Realiza vigílias em todo o país, promove acampamentos, se faz representar no julgamento no Supremo Tribunal Federal-STF contra o marco temporal, aprimora canais de comunicação, organiza a Marcha das Mulheres Indígenas em Brasília e denuncia a perseguição de suas lideranças em eventos internacionais e nas redes sociais. A eleição da advogada Joênia Wapichana, deputada federal (Rede  –RR) em 2018, surge como uma esperança.

Diante desse cenário como os partidos políticos de esquerda, pautam a questão indígena? Como incentivam e apoiam efetivamente candidaturas indígenas ou de representantes dispostos a enfrentar as investidas capitalistas sobre as terras indígenas, o racismo, a omissão da FUNAI e do Poder Judiciário? Quais os investimentos reais na formação politica de quadros para compreenderem as temáticas indígenas e atuarem efetivamente? Até quando as lideranças indígenas posarão de cabos eleitorais sem direito a uma legítima representatividade? Vale lembrar que o Projeto de Lei do Estatuto dos Povos Indígenas tramita no Congresso Nacional desde 1991, sem aprovação até hoje. Não há mecanismos no Brasil que garantam a representação indígena nos Poderes Judiciário e Legislativo.

Não podemos, como militantes e dirigentes partidários, subestimar mais a questão indígena na agenda política e social brasileira quando a Organização das Nações Unidas- ONU, a Anistia Internacional e parte destacada da comunidade mundial denunciam o massacre contra os povos indígenas no nosso país. Um projeto de sociedade de fato revolucionário precisa incorporar essa pauta, que está na ordem do dia.

Estamos conclamados agora para (re)construirnossa democracia que foi aviltada, para a qual superar o racismo é uma condição imprescindível. Em nome de nossa coerência política e compromissos com os princípios socialistas, precisamos reagir com coragem, por nós, pela nossa ancestralidade e pelas futuras gerações.

Claudia Correia é assistente social, professora, jornalista, mestre em Planejamento Urbano e militante indigenista.


Coordenação de Comunicação do PSB Bahia
Cássia Bandeira
Jornalista – DRT: 5210/BA