DO SUFRÁGIO FEMININO AOS DIAS ATUAIS: Qual a política que merecemos para celebrar o março mulher? 

Há mais de cem anos, as mulheres vêm numa luta sem fim por direitos iguais, condições dignas de vida em suas diversas áreas sociais, culturais, profissionais e políticas, batalhas que m sido incansáveis e aguerridas. Mulheres da zona rural, do campo, marisqueiras, pesqueiras, mulheres trans, travesti, lésbicas, bissexuais, assexuadas, encarceradas, mulheres negras, brancas, indígenas, surdas, deficientes físicas, autistas, cegas, atletas, donas de casa, enfim, todas a mulheres carregadas com suas especificidades e todas colocadas num não lugar social.

Existe no Brasil uma farsa teórica, quase umapoética abstrata, quando ouvimos falar em direitos das mulheres, pois, sempre me recorre as incongruências que essa pauta causa na sociedade de formação machista, sexista, patriarcada, misógina, heterossexual e hipócrita.

É difícil pensar numa mulher com liberdade de vida, com autonomia profissional, acadêmica, política, como direito sumário ao seu corpo, que ainda nos dias de hoje,estranheza é um sentimento que está contido numa parcela de pessoas, não é comum a essa sociedade olhar para esse público como parte colaborativa e individual, que tem anseios e desejos. Insistentemente e de maneira perpetua relega, restringe esse corpo a maternagem e ao fazer doméstico. São corpos tratados sem subjetividades, sem condições especificas, abjetos como diz Butler (1996) “relaciona-se a todo tipo de corpos cujas vidas não são consideradas ‘vidas’ e cuja materialidade é entendida como ‘não importante’” para vida social, do trabalho, da escolha.

Como toda luta por direitos que nasceram da ausência, da negação, da invisibilidade, da subserviência, os direitos conquistados por nós mulheres, aos quais nos trouxeram até aqui, Brasil 2022, tiveram consequência irreversíveis, pois, muitas vidas femininas foram ceifadas por reivindicarem justamente aquilo que era para ser apenas um exercício de cidadania, de alguém que produz e contribui para o fortalecimento e crescimento social, que deveria ser acolhido pela sociedade. Causas e efeitos que geraram frutos, mas, mataram árvores e para nós, árvores, que ficamos é irreversível o retorno ao não lugar.

Por isso é importante ressaltar que as mulheres só tiveram direito a irem à escola em 1827, em 1859 a irem a faculdade, a votar no Brasil em 1932, direito a meios anticonceptivo em 1961, a separação, divórcio 1977, a lei Maria da Penha para que não fossemos assassinadas em 2006, lei do feminicídio em 2015 e importuno sexual 2018, apesar da importância dos direitos conquistados, ainda estamos falando cronologicamente a partir de um grupo de mulheres, porque vivemos numa sociedade com preferencias racial e exclusões de sexualidades.

Para além das reivindicações neste âmbito do gênero feminino acessar a vida das mulheres que estão “fora” do contexto social engendrado, as reivindicações precisam ter especificidades de lugar, tempo, racial, sexual e político. Reforço, que as mulheres da zona rural, do campo, as marisqueiras, pesqueiras, as mulheres trans, lésbicas, as encarceradas, por exemplo, são algumas das quais ficam de fora quando a comemoração precisa ser femenageada. Portanto, as especificidades precisam ser respeitadas, alocadas como direitos constitucionais subjetivos e decuidados.

É preciso ratificar que a data comemorativa do dia 8 de março tem fator histórico e determinante a um tempo, lugar, fato, etnicidade racial, sexual e político, logo, não pensar ou não levar em consideração todos esses fatores, é de certa forma, continuar não contemplando as mulheres que estão em outras esferas raciais, sócias, culturais e políticas que permanecem com suas demandas específicasinvisíveis aos direitos constitucionais, suas reivindicações são menorizadas, questionadas e por muitas vezes engavetadas.

Mas, ainda teremos tempo, vontade e coragem para podermos aprofundar tais especificidades desse lugar da constitucionalidade, devido sua importância eprincipalmente porque nos espaços legais onde mora o poder constitucional o masculino prevalece.

Quero encontrar poesia para comemorar o mês das mulheres, quero oportunizar mulheres a trabalhos dignos, em espaços de decisões e poder. Quero poder ler nos noticiários que é ínfimo o número de mulheres violentadas e assassinadas por seus companheiros, e tantos outros, ainda que esses sejam “estranhos” a elas. Quero que elas estejam onde quiserem, como quiserem. Quero ter direito a escolhas e que todas nós tenhamos o poder das nossas vidas nas nossas mãos.

É preciso tornar possível e constituir mecanismos, vagas, que assegurem a participação das mulheres na política. É necessário consolidar estratégias para as bancadas femininas na política, que hoje são ínfimas, mas, de grande relevância para a sociedade como todo, sem que essas sejam diariamente assediadas de todas as formas por seus parceiros políticos.

Não queremos apensas flores no dia 8 do mês de março, homenagens rasas na busca de um status social do “desconstruídoque na prática nos obrigam a disputar apenas um lugar, como se para cada vaga a disputa entre mulheres fossem a navalha que romperá a rede e que sujará os ambientes profissionais. O olhar pejorativo sobre as mulheres ainda nos coloca a margem do que é real e possível, anular as possibilidades que qualificam e dignificam as aptidões femininas é o ranço abominável nessa sociedade, poderia dizer também que é um “câncer” social.

Discutir sobre as imperfeições que distorcem a presença feminina nos espaços de poder, e especificamente na política, novamente, é de suma importância para o avanço de toda sociedade. Para que hoje pudesse existir um dia de luta e reivindicação feminino, foi justamente porque se calar e naturalizar os abusos, as violências, já não eram mais possíveis, era preciso denunciar as péssimas condições de trabalhos e conquistar qualidade de vida.  Não podemos mais morrer para conquistar direitos, não queremos mais travar lutascentenárias para cada conquista a nosso favor.

É necessário um reconhecimento da sociedade numa totalidade expressiva e dialógica onde a práxis seja natural e verdadeira, não há possibilidade de se ter uma sociedade justa, igualitária, democrática sem a paridade de gênero e de raça nos ambientes sociais, seja ele no campoprofissional, cultural ou político. Merecemos tudo aquilo que desejarmos, todos os espaços que quisermos estar.

“Não acredito que seja saudável escolher uma luta e dizer que é mais importante do que outra, mas sim, em reconhecer como as diferentes lutas se conectam. ”

(Angela Davis,1974)

 MULHERES, FILIEM-SE AO PSB!