Vice-líder da oposição na Câmara de Salvador, o vereador Sílvio Humberto (PSB) acredita que a atual legislatura conseguiu avançar na discussão de pautas importantes para a população soteropolitana, embora acredite que o Legislativo ainda precise se esforçar mais para estimular a participação cidadã.

Nesta entrevista exclusiva à Tribuna, o socialista também analisa a gestão do prefeito ACM Neto (DEM), que não teria correspondido aos problemas enfrentados pela cidade, e ainda fala sobre as eleições municipais e as mudanças na legislação eleitoral.

Tribuna – Como o senhor avalia a atuação da Câmara na atual legislatura?
Sílvio Humberto –
Trabalhamos muito, sem dúvida. Essa ideia disseminada que político não trabalha deve ser relativizada. Os interesses são diversos e o trabalho não se resume ao plenário.

A autocrítica é fundamental na política para saber se as decisões adotadas estão sendo coerentes. Entretanto, observamos que manobras são realizadas para evitar que a população se aproprie de discussões fundamentais para o futuro da cidade. Sobretudo as matérias complexas, a exemplo do PDDU, Louos, que eu penso que deveriam ser mais debatidas.

O nosso regimento ainda engessa muito o debate, concentra poder demais no presidente assim como ocorre em outras casas legislativas. Reduziu-se o tempo dos partidos com bancada composta por um ou dois representantes. Há que se impor limites ao regime de urgência dos projetos do Executivo que interferem no ritmo das discussões da Casa.

Portanto, o regimento precisa ser aperfeiçoado. Avançamos muito nessa gestão com a cobertura da TV Câmara, mas temos sempre que envidar todos os esforços para estimular a participação cidadã. Foi um erro acabar com a versão impressa do diário oficial da Câmara.

Tribuna – Como avalia o seu próprio mandato?
Sílvio Humberto –
 Aprendi que ser vereador é saber ouvir, escutar, é gostar de gente. Todo político deveria iniciar sua trajetória como vereador, ali no chão da cidade. Acreditar e praticar a construção coletiva. Como presidente da Comissão de Educação, tive a iniciativa de visitar as escolas da rede municipal, fui conhecer a realidade em que nossas crianças e os profissionais da educação estão vivendo.

Nesses três anos, fiscalizamos, acompanhamos e cobramos a execução de obras e serviços para melhorar a vida da população. A marca do mandato Sílvio Humberto é a coerência com a nossa história de luta em prol da educação pública de qualidade, o enfrentamento ao racismo e suas manifestações, a defesa da igualdade de oportunidades, o combate ao sexismo e ao machismo, apoio as ações de fortalecimento da participação cidadã. Enfim, ter lado, valorizando a política com respeito à cidadã, ao cidadão. Prestar contas. Tanto que sempre me posicionei a favor da cidade.

Fui contra a reforma tributária, administrativa, o PDDU, e a esse plano municipal de Educação, por ter sido votado sem a discussão regimental na Comissão de Educação e sem participação efetiva das educadoras e educadores da rede municipal, justamente por compreender que são questões que vão de encontro aos interesses do nosso povo. Por outro lado, tivemos momentos de triste memória com agressões que não devem ser esquecidos, mas bem registrados para que fatos dessa natureza não voltem a acontecer.

Tribuna – Como avalia a gestão de ACM Neto?
Sílvio Humberto –
 A minha sensação quando olho para nossa cidade é que a atual administração ficou aquém dos desafios da nossa cidade. A administração das coisas que não focou nas pessoas e das obras intermináveis, ver Rio Vermelho, Piatã e Itapuã. Lapa, você pediu e a prefeitura fez, mas malfeito. O ex-mercado do peixe e agora vila Caramuru, cadê o povão que lá frequentava? “Melhora” a infraestrutura e povão sai. Para onde foram as centenas de trabalhadores daquele local? E para quem foi entregue as novas lojas? Quais foram os investimentos atraídos para gerarem emprego e renda?

Continuamos a capital do desemprego. Tenho que fazer justiça, um novo modelo de negócio com as cervejarias e o Carnaval. Parece pirâmide, ganha quem está no topo, os demais (ambulantes, na sua grande maioria mulheres negras, só trocaram dinheiro e fizeram propaganda de graça). Merecemos e podemos mais.

Precisamos de outras prioridades que não seja gerar imagens. Sabe que estudante que tirava em média nota 1 e agora tirou três, aumentou mais de 200%, mas ainda não alcançou a média mínima. Isso não é por falta de capacidade, mas porque não reconhecem seu potencial criativo transformador.

As academias de ginástica ao ar livre foram inauguradas, a exemplo da Praça Marques de Olinda, no largo, na Fazenda Garcia, mas se você não tiver um acompanhamento de um profissional de educação física… O que traria um benefício pode se constituir em malefício. Assim, aproveitar um projeto de indicação a fim de que a prefeitura disponibilize profissionais de educação física em três turnos. Isso sim é assegurar qualidade de vida a Salvador para além do asfalto e das coisas. Salvador é sua gente plural e diversa. Essa é nossa singularidade.

Tribuna – Quais as maiores carências da cidade? O que deve ser colocado como prioridade pelo próximo prefeito?
Sílvio Humberto –
Educação, a atenção à primeira infância, o déficit de creches. Aprendi com a rede de mulheres do subúrbio que a creche não é uma questão feminina e sim de gênero (masculino e feminino). Afeta a vida da família, o programa Primeiro Passo não resolve o problema.

A falta de uma política pública ativa de geração de trabalho e renda. O que foi feito para a juventude, considerando que a juventude negra é a principal vítima de violação de direitos? O transporte coletivo ainda não é de qualidade. Considerando que somos uma cidade tropical, porque ônibus com ar condicionado é para poucos? Por que o bairro do Curuzu tem um único micro-ônibus para atender a população?

A prioridade deveria ser as pessoas. Enquanto as pessoas que moram nos locais distantes da cidade ou nos bairros populares acharem que vão à ‘cidade’ quando na realidade desejam ir ao centro da cidade, é sinal que não são prioridades e não se sentem incluídos.

Tribuna – Com as mudanças na legislação eleitoral, como será a campanha deste ano, sobretudo no quesito arrecadação?
Sílvio Humberto –
 Um grande teste para aperfeiçoar a democracia nesses tempos temerosos. O tempo curto de campanha prejudica os novos candidatos. O convencimento será tudo, “sebo nas canelas”.

Esse sistema de arrecadação tende a favorecer os candidatos que vem dos setores abastados da sociedade. Examinar as propostas e do histórico dos/as candidatas/os será fundamental para escolha dos seus representantes.

Tribuna – Acredita que o cenário nacional da política vai impactar nas eleições municipais deste ano na Bahia?
Sílvio Humberto –
 Sempre ocorreu isso, acredito que ficará mais acirrada a disputa. Uma tentativa de vincular as questões locais das questões nacionais, demonstrando os limites do pacto federativo, ou seja, o grau de dependência dos municípios à União.

Compartilho da visão que há em curso um golpe e temos que resistir a Temer e a seus 22 homens brancos que promovem ajuste fiscal com desajuste social. Resistir é preciso. “Se nos deitarmos estaremos mortos”.

 

Entrevista publicada na edição de 04/08/16 no jornal Tribuna da Bahia